O termo Milagre Econômico alude a um período distinto na história econômica do Brasil, especificamente entre 1968 e 1973, sob a administração dos governos militares. Este intervalo é marcado por um significativo crescimento do Produto Interno Bruto (PIB), acompanhado de uma moderada redução da inflação e uma melhora nas contas do balanço de pagamentos.
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As políticas econômicas implementadas no Brasil durante o regime militar, um período que perdurou de 1964 a 1985, marcaram uma era de profundas transformações e debates acalorados no cenário econômico do país. Com o início da gestão do marechal Humberto Castello Branco, o governo militar embarcou em um caminho de reformas econômicas, tanto de natureza ortodoxa quanto estrutural, com o intuito de estabilizar a economia brasileira e fomentar o seu desenvolvimento.
As reformas ortodoxas referem-se a políticas econômicas tradicionalmente adotadas para combater a inflação e estabilizar a economia. Tais medidas incluem, tipicamente, o controle da oferta monetária, a austeridade fiscal (redução dos gastos públicos), e a elevação das taxas de juros. Essas ações visam reduzir a demanda agregada na economia, o que, por sua vez, ajuda a diminuir a pressão inflacionária. Estas políticas são consideradas "ortodoxas" porque seguem princípios econômicos convencionais e são frequentemente recomendadas por instituições financeiras internacionais como o Fundo Monetário Internacional (FMI) e o Banco Mundial.
Por outro lado, as reformas estruturais têm como objetivo alterar a própria estrutura da economia. Estas reformas são mais profundas e de longo prazo, abrangendo mudanças na legislação trabalhista, reforma tributária, reestruturação do setor financeiro, e abertura da economia para o comércio internacional. O propósito dessas reformas é criar um ambiente mais favorável para o investimento, melhorar a eficiência da economia, e estimular o crescimento econômico sustentável. Em contraste com as reformas ortodoxas, que são mais focadas em estabilização, as reformas estruturais visam a transformação dos fundamentos econômicos e produtivos do país.
O início deste período de "milagre" pode ser rastreado até o contexto político e econômico que o precedeu, dominado por uma situação de estagflação e restrições externas. A administração do Marechal Humberto Castello Branco, iniciada em 1964, lançou as bases para esta transformação, focando na reorganização fiscal e financeira e implementando reformas estruturais essenciais. O Plano de Ação Econômica do Governo (PAEG) emergiu como um componente crucial, introduzindo uma estratégia gradualista no combate à inflação e na promoção da estabilidade econômica. Esse plano, implementado logo no início do regime, estabeleceu as bases para um combate gradual à inflação, enfocando também na reestruturação tributária e financeira do país. As políticas adotadas neste período foram caracterizadas por um forte controle estatal sobre a economia, com uma ênfase significativa no desenvolvimento industrial e na modernização da infraestrutura.
As reformas estruturais desse período, especialmente nas áreas tributária e financeira, foram fundamentais na configuração do cenário econômico subsequente. A reforma tributária teve como alvo o aumento da arrecadação governamental e a racionalização do sistema tributário. Por outro lado, a reforma financeira visou complementar o sistema financeiro brasileiro com mecanismos de financiamento de longo prazo e abrir a economia ao capital externo.
Sob a liderança do presidente Arthur da Costa e Silva e do ministro da Fazenda, Antonio Delfim Netto, em 1968, houve uma significativa reorientação na política econômica. O controle da inflação passou a focar no componente de custos, enquanto políticas de incentivo ao crescimento econômico foram priorizadas. O Plano Estratégico de Desenvolvimento (PED), lançado nesse ano, refletia essa nova abordagem, fomentando investimentos públicos e políticas favoráveis à recuperação dos investimentos privados.
O Milagre Econômico foi caracterizado por taxas de crescimento do PIB em torno de 11% ao ano, um significativo aumento na taxa de investimento, e a expansão dos setores de bens de consumo duráveis e de bens de capital. Este crescimento vigoroso foi acompanhado por uma queda gradual na inflação e uma melhora sensível no balanço de pagamentos.
Diversos fatores desempenharam papéis fundamentais na contenção da inflação durante o regime militar brasileiro, destacando-se, inicialmente, a política monetária expansiva. Essa política envolve o aumento da oferta de moeda e a redução das taxas de juros, com o objetivo de estimular a economia. Ao aumentar a liquidez disponível, facilita-se o acesso ao crédito para empresas e consumidores, incentivando o consumo e o investimento. Este tipo de política é geralmente adotado em períodos de baixo crescimento econômico, visando impulsionar a atividade econômica.
Outro fator relevante foi a capacidade ociosa da economia, herdada do período anterior ao milagre. Esta capacidade ociosa refere-se a recursos produtivos que não estão sendo plenamente utilizados, como fábricas que não operam em plena capacidade e mão de obra desempregada. A existência dessa capacidade permite que a economia cresça e se expanda sem pressionar significativamente os preços, pois há um margem para absorver o aumento da demanda sem necessitar de expansão proporcional na oferta, evitando assim a inflação.
O controle direto de preços e salários pelo governo também foi um elemento chave. Esta estratégia envolveu a fixação governamental dos preços de produtos e serviços essenciais e a regulação dos aumentos salariais, com o intuito de controlar a inflação. Ao limitar o aumento de preços e salários, o governo buscava diminuir as pressões inflacionárias, especialmente em setores estratégicos da economia.
Ademais, a adoção de uma política cambial de minidesvalorizações cambiais contribuiu para o equilíbrio externo. Esta política consistia em ajustes pequenos e frequentes na taxa de câmbio, em contraposição a depreciações súbitas e de grande magnitude. O objetivo era evitar desequilíbrios significativos na balança comercial, mantendo a competitividade das exportações sem gerar instabilidade ou expectativas negativas no mercado.
A captação deliberada de recursos externos também foi uma estratégia crucial para manter o equilíbrio das contas externas. Através da atração de investimentos estrangeiros e da contratação de empréstimos no exterior, o Brasil buscou complementar os recursos internos, financiando projetos de desenvolvimento e mantendo as reservas internacionais em níveis saudáveis. Este influxo de capital externo foi essencial para sustentar o crescimento econômico e manter a estabilidade do balanço de pagamentos no período.
No entanto, o Milagre Econômico também acarretou desafios significativos. O modelo de correção monetária implementado teve efeitos adversos na dinâmica de preços, e o aumento da dependência externa do país, tanto no setor industrial quanto no financeiro, apresentou riscos evidentes com o advento do primeiro choque dos preços do petróleo em 1973.
O milagre reflete, portanto, um período de transformação econômica e política significativa, caracterizado por um robusto crescimento econômico. Contudo, também legou desafios estruturais e de dependência que se manifestaram em períodos subsequentes. Esta era foi marcada por um modelo econômico orientado pelo estado, onde políticas governamentais desempenharam um papel central na direção da economia. As políticas implementadas durante esse período tiveram impactos de longo alcance, moldando o desenvolvimento econômico brasileiro nas décadas seguintes.
O legado do desse período é complexo. Por um lado, representou uma época de crescimento econômico sem precedentes e avanços significativos em infraestrutura e industrialização. Por outro lado, foi marcado por uma dependência crescente de capital externo e uma distribuição de renda desigual, exacerbando as disparidades sociais.
A análise desse período revela uma interação intrincada entre política econômica, estabilidade política e desenvolvimento econômico, demonstrando como as escolhas políticas e econômicas podem ter profundas implicações de longo prazo na trajetória de um país.
Como recomendação de leitura, deixo o seguinte livro de recomendação:
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